Ter desconto que pode chegar a 20% na conta de luz e contribuir para a geração de energia sustentável sem precisar fazer investimentos ou obras. Esses são alguns dos benefícios oferecidos por empresas que produzem e fazem a compensação de energia solar. Um negócio que se tornou viável a partir da geração de energia em usinas fotovoltaicas, também conhecidas como fazendas solares
Michelly Oda – DA REDAÇÃO
Foi justamente o sol, que sempre impôs tantos desafios para quem mora no Norte de Minas Gerais, que atraiu o interesse de grandes grupos de investidores do Brasil e do mundo para a região. Uma das empresas que produz e faz a compensação da energia captada do sol é a Evolua Energia, que surgiu em 2019 por meio da parceria formada entre AG Participações, BMPI Infra e Green Yellow. A primeira usina fotovoltaica da Evolua já está em operação e fica em Pirapora. “Somos uma empresa totalmente digital, com o objetivo de tornar a energia fotovoltaica acessível para consumidores que não possuem capital para realizar o investimento ou área necessária para a implantação de placas fotovoltaicas. Focada na geração de energia distribuída, a Evolua produz energia nos parques solares e a injetam na rede de distribuição da Cemig. A partir disso, a energia injetada vira créditos em nome dos clientes (pessoa física ou jurídica), gerando desconto na conta deles”, fala o diretor e gerente de engenharia, Rodrigo Tobias.
Assim como em outros tipos de energia, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) é responsável pela regulação da energia fotovoltaica. A partir de 2012, a autarquia vinculada ao Ministério de Minas e Energia estabeleceu a Resolução 482, com regras que permitiram aos consumidores gerarem sua própria energia elétrica a partir de fontes renováveis ou cogeração qualificada. Nesse cenário, foram estabelecidos os conceitos de micro e minigeração distribuídas. “Hoje, nós temos em termos de tamanho, de volume, dois patamares de geração solar distribuída: nós temos a microgeração, que vai até 75 kilowatts, e a minigeração, que parte de 75 até 5 mil kilowatts”, detalha Marcílio Ribas das Virgens, gestor de projetos que atua na área de energia fotovoltaica. Acima desse patamar, está a geração centralizada, composta por grandes projetos.
A microgeração está ligada às instalações de menor porte e com fornecimento em baixa tensão, como as que são comumente vistas nos telhados das residências nas cidades. Já a minigeração tem fornecimento em média tensão e foi criada para atender a uma demanda de consumo maior, como é o caso das fazendas solares. A Aneel permitiu ainda o acúmulo de créditos de energia, quando a quantidade gerada é superior ao consumo. Os créditos podem ser utilizados em um prazo de até 60 meses e em unidades consumidoras diferentes, desde que tenham a mesma titularidade e estejam em uma mesma área de concessão, o que é uma grande vantagem no estado, já que a Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) atende a 8,6 milhões de consumidores, divididos entre 774 municípios.
Sobre o perfil de investidor que aposta na minigeração, Marcílio Ribas explica que, geralmente, são fundos de investimento que fazem o aporte com a intenção de ter uma rentabilidade acima dos ganhos de capital ofertados pelo mercado. O retorno do negócio é a longo prazo, o que faz com que os contratos de arrendamento com os donos das propriedades onde as usinas são instaladas sejam feitos para uma exploração por um período mais longo, cerca de 25 anos, por exemplo. “Eventualmente, temos algum investidor que tem um consumo e tem uma necessidade de ter uma energia mais barata para ter um diferencial no mercado em que atua, como por exemplo uma rede de supermercados. Tem acontecido de essas grandes redes investirem na implantação do empreendimento para gerar energia e fazer a compensação direto nas suas lojas. Junto a isso, os clientes ligados à baixa tensão também estão muito interessados em fazer a compensação, porque o ganho financeiro é muito grande”, exemplifica Marcílio Ribas.
É nesse último caso citado que empresas, como a Evolua, encontram espaço para atuar. Os clientes se unem por meio de uma associação ou cooperativa e passam a receber a energia gerada nas usinas. O repasse se dá por meio de compensação, já que a venda de energia propriamente dita não é permitida. “Fomos contactados por dois grupos investidores internacionais, de Dubai e do Canadá, que querem fazer investimentos na geração concentrada. Apresentamos alguns projetos, mas eles querem apenas os acima de 300 milhões de reais. Quando o investimento é atraente, o capital aparece”, complementa Ribas.
Por que o Norte de MG?
No Norte de Minas, os primeiros experimentos que geraram energia a partir do sol foram implantados pela Cemig, em meados de 2002. “A Cemig começou a implantar pequenos projetos na região para atender aqueles clientes longe da rede elétrica e que também precisavam de atendimento. Eram sistemas bem simples, com três ou quatro placas de geração que alimentavam baterias, que no período noturno alimentavam lâmpadas e, quando muito, uma geladeira. Essas situações ocorreram na região de São Francisco, Januária, comunidades ribeirinhas, principalmente as situadas em ilhas”, lembra Marcílio Ribas das Virgens.
Mas por que os investidores apostam no Norte de Minas Gerais? Marcílio explica com base em vários fatores: “O primeiro deles é a questão da insolação. Aquilo que no passado era uma dificuldade para a região, é uma vantagem comparativa frente às outras regiões, já que o lugar tem uma das melhores insolações do Brasil. Junto a isso temos a questão da tarifa de energia da Cemig, que é muito alta. Por último, temos a questão do ICMS, em que foi feita uma isenção por parte do governo estadual para fazer a compensação de energia. Esses fatores trouxeram esse rápido desenvolvimento para o sistema solar fotovoltaico no Norte de Minas”.
A incidência dos raios solares foi um dos fatores observados pela Evolua Energia no processo de escolha da região para a implantação de sua primeira usina.
“O Norte de Minas Gerais é uma região que possui uma irradiação solar muito boa e que otimiza a geração de energia das usinas fotovoltaicas (UFVs), chegando a gerar até 10% a mais de energia do que em outras regiões do estado. A presença da Evolua nas regiões também auxilia o desenvolvimento social e econômico, contribuindo para a geração de empregos nas cidades que as UFVs são construídas”, ressalta Rodrigo Tobias.
Além de inúmeras fazendas solares, a região tem, em Pirapora, uma das maiores usinas fotovoltaicas da América Latina com capacidade de 400 megawatts de potência, o suficiente para fornecer energia para 420 mil casas, durante um ano. O empreendimento está dentro da geração centralizada.
Geração de emprego e renda
Com Minas Gerais figurando no topo da geração distribuída, com 862,9 megawatts de potência instalada, segundo a Absolar (Veja o gráfico com o ranking dos estados), junto com os investimentos financeiros externos surgiram novos mercados para as empresas que já atuavam na região. Esse é o caso da Delta Energias, que tem a origem ligada ao setor da indústria, só que decidiu apostar na energia fotovoltaica.
“Em 2016, iniciamos as atividades no setor solar por termos clientes que estavam migrando para a geração distribuída e por percebermos que as atividades estavam se firmando com a vinda das empresas, principalmente para o Norte de Minas e Zona da Mata. Iniciamos as implantações e desenvolvemos expertise nesse mercado de minigeração, que é um pouco diferente de microgeração. A Delta se especializou no desenvolvimento como epcista (termo derivado da sigla em inglês EPC, que significa engenharia, aquisição e construção). Os primeiros passos são feitos pelos nossos parceiros de negócio, como liberação de meio ambiente e os arrendamentos de fazendas. A gente entra com toda a parte de projetos, infraestrutura, gerenciamento de todo o processo de compra e aquisição dos materiais, toda a parte de engenharia de campo, do início ao comissionamento no sistema, com a conexão junto à Cemig”, explica Eron Souza de Oliveira, sócio-administrador da Delta.
“Trata-se de um mercado que ainda tem muito a ser explorado, e conseguir a mão de obra se torna um desafio, pois temos um padrão de formar nossos profissionais desde o início das atividades, haja vista que não achamos essas pessoas prontas no mercado. Hoje, 80% do nosso quadro de funcionários vem de outros estados, como Piauí e Bahia, e de municípios, como Pirapora e Janaúba, onde usinas já foram instaladas. A intenção é ter os melhores profissionais de cada área para manter a qualidade do serviço, trabalhos com um padrão de cliente muito exigente”, planeja Eron Oliveira.
Para se ter uma ideia da geração de empregos, uma usina de 5 megawatts mobiliza de 40 a 60 pessoas por um período de três a quatro meses. Após a implantação da obra, a quantidade de mão de obra cai sensivelmente, porém há ainda a necessidade de manutenção das instalações, fase que abre espaço para a atuação de outras empresas, como as que prestam o serviço de vigilância, por exemplo. E ainda na cadeia que envolve a implantação das fazendas solares estão os proprietários das terras onde elas serão implantadas. Eles também lucram ao fechar contratos com os investidores.
“A rentabilidade que os proprietários conseguem com a agricultura e a pecuária é menor do que uma oportunidade de arrendamento de terra para a implantação de energia. O dono da terra enxerga uma oportunidade de negócio em que vai estar isento de manejo e dos custos para operacionalizar o negócio. Ele disponibiliza o local e tem uma rentabilidade maior do que se tratasse daquelas atividades corriqueiras que tem para a ocupação da terra”, explica o gestor de projetos Marcílio Ribas.
UM GANHO PARA O MEIO AMBIENTE
Dados da Associação Brasileira de Energia Fotovoltaica (Absolar) mostram que desde 2012 foram instalados mais 7,7 gigawatts no Brasil, com investimentos de R$ 39,8 bilhões. Além dos benefícios financeiros para a economia, com geração de emprego, renda e tributos, quem atua no setor solar destaca o baixo impacto ambiental para a instalação das placas. Além disso, após a implantação dos sistemas, outros benefícios são convertidos para o meio ambiente. Para se ter uma ideia, desde que esse tipo de energia ganhou incentivos, menos 1,1 milhão de toneladas de CO² foram emitidos para a atmosfera.
“Além do impacto ambiental positivo gerado pela produção da energia solar, a partir da implantação das UFVs, a Evolua também se preocupa com o impacto que pode ser gerado com seus processos. Pensando nisso, adotamos, desde o início da empresa, processos totalmente digitais, que diminuem o impacto negativo que poderia ser gerado no meio ambiente. Um exemplo disso é que somente com o processo de contratação da Evolua por pessoas jurídicas, a utilização do processo digital fez com que deixássemos de gastar mais de 2.500 litros de água, além de não emitir 250 kg de carbono”, ressalta Rodrigo Tobias.
SUPERAÇÃO EM MEIO À CRISE
Diante do cenário da pandemia, 2020 foi sem dúvidas um dos anos mais desafiadores para toda a economia mundial
Só que, mesmo diante de uma realidade de estagnação e prejuízos para a maioria das atividades, a energia fotovoltaica parece não ter sido afetada como as demais, como afirma o sócio-administrador da Delta: “Os investidores estavam na expectativa de ver os projetos saírem do papel, e nossas atividades são executadas em áreas rurais, com um trabalho que preza pela segurança, garantindo, entre outras condições, a higienização e distanciamento entre os trabalhadores”. Com 15 megawatts instalados atualmente, a empresa pretende dobrar esse número em 2021.
Um levantamento da Absolar aponta que 2020 foi um ano de novos recordes para o setor, que atraiu mais de R$ 13 bilhões em investimentos, gerando mais de 86 mil empregos. Somando-se as gerações distribuída e centralizada, a capacidade de geração do Brasil teve um crescimento de 64%, de 4,6 gigawatts, em 2019, para 7,5 gigawatts, em 2020. No ano da pandemia, os cofres públicos arrecadaram R$ 3,9 bilhões com o mercado solar fotovoltaico.
“Tivemos o diferencial de estarmos em um setor muito aquecido, e que conseguiu superar as dificuldades para continuar crescendo. Esperamos que 2021 seja um ano ainda melhor com a vinda da vacina e a volta à normalidade para todos os setores e para os nossos clientes”, espera o diretor e gerente de engenharia da Evolua, Rodrigo Tobias.
Para 2021, a expectativa do diretor e gerente de engenharia da Evolua é implantar mais 35 megawatts, que permitirão atender mais de 3 mil clientes, e poderão gerar 500 postos de trabalho. Apesar do cenário promissor, Tobias diz que os empreendedores do setor estão receosos quanto à revisão da Resolução Normativa nº 482/2012, da Aneel: “A Agência Nacional de Energia Elétrica quer reduzir incentivos e compartilhar custos da distribuidora”. Em resumo: o governo federal quer taxar a energia solar. Com o objetivo de ampliar as discussões sobre o processo de atualização da resolução, a Absolar criou a campanha “Brasil, deixe a solar crescer”. A associação é contra as mudanças na norma, que permitiu aos consumidores gerar e consumir a sua própria eletricidade a partir de fontes limpas e renováveis.
Além das questões relacionadas à normativa, um outro desafio se impõe à cadeia da minigeração distribuída. Como as usinas são diretamente ligadas à rede da Cemig, atualmente há uma capacidade limitada para que novas fazendas solares sejam implantadas. De forma simplificada, por meio da localização do terreno, é possível saber se haverá uma subestação disponível para receber a energia que será injetada na rede. No caso de não haver, cabe ao investidor a decisão de arcar com os gastos de adequação, o que faz com que os custos aumentem consideravelmente, inviabilizando o negócio.
“Hoje, existem mais investidores interessados em fazer o aporte na região construindo empreendimentos do que a disponibilidade desses empreendimentos para fazer a construção. A demanda por projeto é bem maior do que a oferta. A quantidade de empreendimentos a serem implantados em 2021 será maior. O que tem sido implantado de geração distribuída até o momento é pequeno frente ao que está por vir, assim como nas gerações concentradas. Estamos no início desse ciclo”, opina Ribas.
“BRASIL, DEIXE A SOLAR CRESCER”
Caso o cenário permaneça o mesmo, isto é, sem as mudanças propostas pela Aneel, a expectativa da Absolar é:
– Mais de 672 mil novos empregos até 2035;
– Mais de R$ 25 bilhões em nova arrecadação até 2027 para os governos;
– Mais de R$ 13,3 bilhões em ganhos líquidos no setor elétrico até 2035;
– Menos de 75,38 milhões de toneladas de CO2 até 2035
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