Doze idosos sofrem violência por hora em Minas Gerais. O dado demonstra a vulnerabilidade na qual essa parcela da população se encontra. Em muitos casos, o agressor é integrante da própria família. O medo de pedir ajuda faz com que muitas vítimas deixem de acionar as autoridades policiais em busca de amparo. Com isso, mesmo assustadores, os números apresentados pela administração estadual ainda não demonstram a real situação, visto a existência de subnotificações, conforme evidenciado pela Polícia Civil.
Somente nos quatro primeiros meses deste ano, a violência contra idosos teve aumento de 26% se comparada com os dados de três anos atrás. De janeiro a abril de 2020 foram registradas 26.782 ocorrências, enquanto neste ano saltou para 33.813. Os dados, conforme a Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp), abrangem as seguintes infrações: furto, estelionato, ameaça, vias de fato/agressão, roubo, lesão corporal, dano, injúria, difamação, perturbação da tranquilidade, apropriação indébita, calúnia e maus-tratos.
A dona de casa Elídia Maria da Silva, de 73 anos, foi vítima de estelionato. Na primeira quinzena de junho — mês que marca a celebração da Conscientização da Violência Contra a Pessoa Idosa —, ela sofreu um prejuízo de mais de R$ 2 mil. Criminosos se passaram pelo filho dela e solicitaram transferências bancárias.
“O bandido fez de conta que era meu filho e me pediu dinheiro emprestado. Mandou mensagem falando que havia tido um problema na conta bancária e que estava utilizando um novo número de celular. Eu acreditei, pois, realmente, de vez em quando, empresto alguma quantia. Só que nunca no valor que solicitaram”, conta a moradora de Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte.
Os estelionatários pediram R$ 2.900 para Lídia e queriam que a transferência acontecesse pelo PIX. “Eu não tenho essas coisas. Acabei indo duas vezes na casa lotérica para depositar o dinheiro que tinha. Mandei R$ 2.350. Eles ficaram na ‘minha cola’ mandando mais mensagens pedindo o restante”.
O sentimento que ficou é de revolta, conforme desabafou a idosa. “É revoltante tudo isso. Fiquei sem nenhum centavo. Não tinha R$ 1 para comprar pão. Eles me enganaram se passando pelo meu filho. Eu até suspeitei a princípio, mas não sei dizer o que aconteceu na hora. Não ‘tive expediente’ para desconfiar e ligar, por exemplo, para o meu filho e confirmar se era ele”, afirmou.
Subnotificação é realidade
O que aconteceu com Lídia chegou até os órgãos oficiais para os devidos registros, no entanto, muitos outros ficam pelo caminho. A delegada titular da Delegacia Especializada de Atendimento à Pessoa com Deficiência e ao Idoso em Belo Horizonte, Naira Rajab, alerta para a existência de subnotificações e explica a razão.
“Existe, sim, o aumento da violência contra o idoso. A principal causa para este aumento é a vulnerabilidade, tanto física quanto psicológica. Além de serem vítimas mais fáceis pela fragilidade, muitos não conseguem denunciar, especialmente quando é praticada por familiares. E aí existe a subnotificação da violência, em razão do medo, e da própria dificuldade de locomoção e de expressar a violência sofrida”.
A violência contra a pessoa idosa, como pontuado pela delegada, acontece, na maioria das vezes, no ambiente familiar, espaço, em tese, de acolhimento. “As principais violações do direito do idoso são patrimoniais pela apropriação indébita de proventos, pensão do idoso e violações à liberdade de locomoção e integridade física, como crimes de maus-tratos e lesão corporal”.
Acolhimento é alternativa
A saída de casa é, em alguns casos, a forma de escapar das violências. Em Belo Horizonte, 669 pessoas idosas estão em Instituições de Longa Permanência (ILIPIs). “Possuímos uma rede de 30 unidades de acolhimento para pessoas idosas que, em algum momento, não puderam viver mais com as famílias ou sofreram violação de direitos e precisaram ser acolhidas. É mais uma retaguarda que o município tem para garantir a proteção dessa população”, destaca Marcel Belarmino, diretor de Proteção Social Especial da Prefeitura de Belo Horizonte.
O encaminhamento dos idosos para as ILIPIs acontece mediante vontade própria após serem atendidos pelos serviços socioassistenciais. “O Centro de Referência de Assistência Social (Cras) e o Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas) são serviços que atendem os idosos quanto identificam violência e violação de direitos. Eles fazem os encaminhamentos para a central de vagas, que vai avaliar previamente e definir a captação nas unidades”.
Ao contrário do que acontece com crianças e adolescentes, os idosos não precisam de autorização judicial para irem para as unidades de acolhimento. “Não há necessariamente a decisão da Justiça, a não ser nas situações em que a pessoa idosa não responde pelas suas próprias decisões”, destacou.
Uma das razões para o aumento da violência contra os idosos está, na análise de Belarmino, pelo período de reclusão social imposto pela Covid-19. “A pandemia agravou a situação de violação de direitos, pois os idosos ficaram mais restritos do convívio comunitário. Logo, ficaram mais submetidos a situações de negligências. As redes de apoio se enfraqueceram”.
Procure a polícia
Denunciar os agressores é mais do que necessário. “As denúncias podem ser feitas anonimamente pelo disque 100. Pode ser feito o acionamento da Polícia Militar ou procurar a própria Polícia Civil na delegacia para que seja aberto o procedimento criminal”, informou a delegada Naira Rajab.
Outra alternativa encontrada pelas autoridades é o reforço em campanhas educativas para que os idosos saibam os direitos que possuem. “Queremos ampliar a proteção à vítima idosa e isso pode acontecer através de campanhas educativas que deixem claro os direitos, quais são as formas de violência e como buscar ajudar. O maior receio dos idosos denunciarem práticas da violência é pelo fato disso ocorrer nos lares e elas terem que retornar para lá”.
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