Laura*, de 46 anos, sempre foi conhecida como uma das mais animadas de sua roda de amigos. Adorava viajar e era a primeira a dizer “sim” para convites de shows e encontros de motociclismo. Aos poucos, porém, ela mudou: tornou-se introspectiva, e o entusiasmo se foi. “Eu sentia dor, uma melancolia que não sabia de onde vinha. Tinha um nó na garganta, uma vontade de chorar, de gritar. Em certo momento, passei a pensar que a única forma de me livrar do sofrimento era morrendo”, descreve a mulher, que por muito pouco não concluiu o plano. Foram duas tentativas de suicídio antes que a ajuda de amigos e o acompanhamento psiquiátrico a resgatassem da depressão profunda.
A história de Laura, que mora em Contagem, na região metropolitana de BH, lança luz sobre a urgência de se falar sobre prevenção ao suicídio, tema da campanha nacional Setembro Amarelo. Para se ter uma ideia, a cada quatro horas, uma pessoa tira a própria vida em Minas, em média, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública – é o segundo maior índice entre os Estados do país. Foram 2.027 casos em 2022, 13,9% a mais que no ano anterior.
Apesar da alta de casos, é possível reverter as estatísticas, desde que familiares e amigos de pessoas em risco aprendam a identificar os sinais por trás do suicídio, segundo especialistas. Eles ressaltam que 97% dos casos de autoextermínio são associados a transtornos mentais.
“A maioria das pessoas que se mata verbalizou a ideia antes. Muitas vezes quem faz fala antes de fazer”, alerta o psiquiatra Bruno Brandão.
No entanto, nem todos os sinais de um suicídio iminente são claros, ressalta a psicóloga Vívian Zicker, integrante da Associação Brasileira de Estudos e Prevenção de Suicídio. “Muitos familiares dizem: ‘Mas ele não deu nenhum sinal’. Será mesmo? Será que ele não estava bebendo mais ou emagreceu muito, por exemplo? Esses também são indícios”, esclarece.
Tratamento psiquiátrico e rede de apoio salvam vidas
Ele acrescenta que, uma vez identificado o risco de suicídio, é fundamental encaminhar o paciente a um especialista em saúde mental, para diagnóstico, medicação e tratamento adequados. “É possível que a pessoa abandone as ideias suicidas e retome a vida normal”, afirma o médico.
Além disso, familiares e conhecidos devem oferecer apoio, mas sem julgamentos. No caso de Laura, por exemplo, a acolhida dos amigos foi fundamental para que ela voltasse a encontrar sentido na vida. “Foram eles que me jogaram para cima”, diz.
Em dez anos, casos de suicídio subiram 42%
Em Minas, os casos de autoextermínio de pessoas com idades entre 5 e 74 anos cresceram 42,4% entre 2011 e 2021, segundo dados do Ministério da Saúde – de 1.219 para 1.736. A maioria dos casos é na faixa etária de 20 a 59 anos, na qual as ocorrências aumentaram de 996 para 1.369, 37,45% nos mesmos dez anos.
No entanto, chama atenção a elevação dos casos entre jovens de 10 a 14 anos – a alta foi de 80% no período, de dez para 18. Questões religiosas, de identidade de gênero e de ideologia política têm sido observadas por especialistas como causas do distanciamento e sofrimento em pacientes mais novos.
“Os jovens estão sem condições internas de lidar com as dificuldades e não encontram suporte nos meios familiar e social”, analisa a psicóloga Daniela Prestes. Segundo ela, além de amor, na família devem existir “diálogo e autoridade para apontar que todos nós estamos submetidos a limites”. (Com agências)
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