DECEMBER 9, 2022

Prefeitura doa terreno estimado em R$8 milhões no Ibituruna

PL do executivo será votado nesta terça-feira (21) pela Câmara de Vereadores de Montes Claros

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Novo fórum deve ser inaugurado em junho de 2023 e faz aumentar a especulação imobiliária nas imediações do Ibituruna/ Foto: TJMG

Por Verônica Pacheco

A Câmara de Vereadores de Montes Claros vota, nesta terça-feira (22) o Projeto de Lei 49/2021 apresentado pele Executivo Municipal em 02 de junho de 2021. Ele prevê a doação de um terreno de mais de 8.000 m², pertencente ao município, localizado em área nobre do bairro Ibituruna, cujo valor estimado é de R$8 milhões de acordo.

A pauta de votações tornada pública não indica o local, nem o beneficiário da doação, que pode ser confirmada com o apertar do sim por maioria simples, ou seja, 12 votos a favor. A Revista Tempo entrou em contato com a Assessoria de Comunicação do Legislativo Municipal com pedido de informações sobre a votação de amanhã. Até a tarde de hoje, a íntegra do PL 49 não estava disponível para consulta pública de seu teor. O documento só seria apresentado à imprensa amanhã, no momento da votação. Questionada sobre a necessária publicidade dos atos da administração pública, a assessoria informou que o PL havia sido digitalizado (veja reprodução abaixo).


Pelo projeto, metade do terreno – que tem área equivalente a um campo de futebol – será destinado para o Ministério Público (4.033,565m2 (quatro mil e trinta e três metros e quinhentos e sessenta e cinco decímetros quadrados), correspondente a área “C”, situada no Loteamento Bairro Ibituruna) e a outra metade (4.033,565m2 (quatro mil e trinta e três metros e quinhentos e sessenta e cinco decímetros quadrados), correspondente à área “D”, situada no Loteamento Bairro Ibituruna), para a OAB.

A autarquia pretende fazer escritórios compartilhados e estacionamento no local, como diz o parágrafo único do artigo 2° da proposta. “O imóvel doado deverá utilizado ser exclusivamente, para a edificação das instalações dos Escritórios Compartilhados da Ordem dos Advogados do Brasil Seção Minas Gerais e estacionamento de veículos para advogados”.


O PL teve parecer favorável pela Comissão de Legislação, Justiça e Redação da Câmara e segue para votação podendo ser aprovado em uma única sessão, exceto se houver pedido de vista. Pela lei, o município pode doar seus bens imóveis, sendo necessário justificar o interesse público. Como está abrindo mão de arrecadar com a venda do imóvel, a renúncia deve ser plenamente fundamentada por razões de interesse social e isso é o que deve restar claro na votação.

André Crisóstomo, presidente da OAB Montes Claros, está confiante pela aprovação do projeto/ Foto: Arquivo pessoal


O presidente da OAB em Montes Claros, Andre Crisóstomo Fernandes, está confiante e conversou com todos os vereadores para explicar o projeto antes que fosse à votação. Ele lembra que a advocacia é função essencial à justiça e clama pela dignidade da profissão e dos profissionais. “A advocacia é uma função pública por força da lei 8.906 94. Sem advogado não funciona o poder do Estado que é o Judiciário, a indispensabilidade está prevista no artigo 133 da Constituição da República, como atividade essencial e indispensável no Estado Democrático de Direito”, explica.

Com a construção do novo fórum no bairro Ibituruna, que deve ser inaugurado em junho de 2023, a sala destinada aos advogados prevista na obra é menor do que a existente hoje, embora o espaço físico seja maior. Montes Claros tem hoje cerca de 4 mil advogados e o presidente da Ordem considera o espaço previsto no projeto insuficiente e indigno da importância da profissão para o exercício de direitos.

O presidente da Ordem diz da dificuldade de jovens advogados e de colegas que não conseguem absorver os custos decorrentes da manutenção de salas comerciais. Segundo ele, apenas 15% do que é arrecadado com anuidades volta para subseção, valor que custeia no máximo a folha de pagamentos da entidade.

“O Jovem advogado não consegue ingressar na profissão. Temos um espaço alugado na avenida Cula Mangabeira para uso dos profissionais, mas a possibilidade das salas compartilhadas perto do novo fórum, irá facilitar o início e até a reinserção dos profissionais. Os colegas precisam de um espaço adequado para atendimento e exercício da profissão. Temos sala no presídio regional, no presídio do Eldorado, na delegacia de plantão, no fórum do trabalho e na justiça federal, no juizado especial, além da sede, mas o espaço disponibilizado no novo fórum é incompatível com a necessidade que temos. A gente está vivendo uma fase muito delicada do próprio estado democrático de direito, não podemos vulnerar ainda mais o exercício da atividade profissional que defende os direitos da população”, disse Crisóstomo.


Mas nem todos concordam com a medida e seus fundamentos. O advogado de direito público e imobiliário, Samuel Braúna, discorda da destinação dada ao terreno, ainda que favoreça a categoria à qual pertence.

Samuel Braúna, advogado, discorda da alegação de interesse público na doação do terreno/ Foto: Arquivo pessoal

“Como advogado e cidadão, a gente sempre deve procurar pautar pelo máximo de transparência e publicidade, dois princípios importantes e eu citaria aí um terceiro que é a importância da participação dos cidadãos, que garante um desfecho mais ético, mais moral aos atos públicos, sobretudo quando você está abrindo mão de receitas. Se esse terreno está localizado numa das áreas mais valorizadas da cidade, se é um terreno que poderia servir a tantas instituições que de fato tenham interesse público, por que entregar para OAB? O projeto no mínimo deveria ter sido debatido, discutido, o ideal é até que houvesse uma audiência pública para da uma destinação para aqueles imóveis que de fato servissem ao interesse público, à população de Montes Claros. Da forma como está sendo, vai atender ao interesse de poucos, talvez só da OAB de maneira que não atinge a função social, o interesse público de destinar os recursos no máximo de pessoas possível. Se o terreno fosse vendido, num momento como esse de crise financeira em razão da pandemia, seriam valores importantes para investir nas escolas municipais, de profissionalização que é o que a população precisa e até mesmo com distribuição por meio de programas sociais que atendam a população em extremo risco de vulnerabilidade”, conclui o advogado.


A Revista Tempo pediu informações sobre a doação à prefeitura de Montes Claros que esclareceu, por meio de nota, que “a doação aconteceu porque o Município não tem o objetivo de arrecadar dinheiro com vendas, mas sim que os terrenos públicos cumpram uma função social, o que é o caso, já que um dos terrenos será doado para o estado de Minas Gerais, que irá montar a sede do Ministério Público Estadual, e o outro terreno irá para a OAB, uma autarquia federal, que irá montar escritórios compartilhados no local, para serem utilizados por advogados em início de carreira. Quanto à publicidade da votação, isso é um assunto da Câmara, já que o projeto de Lei do Executivo foi a ela encaminhado, conforme a legislação vigente”.


Sobre a doação e uso do terreno pelo Ministério Público, até o fechamento desta matéria, a instituição ainda não havia se posicionado por meio de sua assessoria de comunicação em Belo Horizonte. Tanto o MP quanto a OAB tem dois anos para iniciar as obras até 5 anos para promoverem a edificação do terreno, caso contrário o mesmo volta para o domínio do município.

A votação de amanhã será presencial no plenário da câmara e pode ser acompanhada pela TV Câmara e pelo canal do legislativo municipal no Youtube a partir das 7h45.

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