DECEMBER 9, 2022

Entrevista – Santa Casa 2050, por Maurício Sérgio Sousa e Silva

MICHELLY ODA DA REDAÇÃO À frente do mais importante hos- pital da região, Maurício Sérgio Sousa e Silva concedeu entrevista à Tempo falando sobre como fez para transformar a Santa Casa de Montes Claros em uma das instituições filantrópicas de maior relevância no país. A relação do superintendente com a instituição começou há 45 anos, […]

04

MICHELLY ODA DA REDAÇÃO

À frente do mais importante hos- pital da região, Maurício Sérgio Sousa e Silva concedeu entrevista à Tempo falando sobre como fez para transformar a Santa Casa de Montes Claros em uma das instituições filantrópicas de maior relevância no país. A relação do superintendente com a instituição começou há 45 anos, quando o filho de Maria de Lourdes Sousa e Silva e de Jaimir Oliveira Silva nasceu no local. Casado há 17 anos com Aline Guedes Peixoto e Silva, é pai de Lívia, Laís e Davi.

Em 2013, Maurício recebeu um convite e decidiu aceitar um novo desafio: deixar a sólida carreira em empresas de telecomunicações para ser gestor na – até então desconhecida para ele – área da saúde. Jovem e dinâmico, assumiu a superintendência da Santa Casa em 1º de janeiro de 2014 e estabeleceu três pilares: humanização, sustentabilidade e excelência. O resultado do trabalho, feito com muito esforço, seriedade e visão de futuro, lhe rendeu reconheci- mento nacional por meio de vários prêmios, e o respeito de empresas e da população, que abraçaram e investiram na Santa Casa.

Os sete anos de dedicação e bons frutos chamaram também a atenção de várias lideranças políticas, que apostavam em Maurício como candidato nas eleições de 2020. Os convites foram recusados porque o gestor quer investir seu tempo e energia em projetos que levem a assis- tência médica à população com excelência e humanização, como o Hospital Verticalizado, que pre- vê a construção de duas torres, com 15 e 30 andares. Hoje, a Santa Casa é referência para dois milhões de pessoas, faz mais de 100 mil procedimentos mensais e oferece serviços de alta complexidade com tecnolgia de ponta.

Maurício Sérgio Sousa e Silva – Fotos Solon Queiroz

TEMPO – Sabemos que as dificuldades enfrentadas por instituições filantrópicas são enormes.  Não é raro ouvirmos ou lermos sobre hospitais à beira da falência ou que precisam até fechar as portas. Nessa realidade, a Santa Casa traz um exemplo diferente. Na sua visão, de gestor, como isso é possível?

MAURÍCIO SÉRGIO – Penso que o principal motivo é despertar no time   o sentimento de pertencimento, além de mudar a visão no sentido de não esperar acontecer, não justificar as dificuldades… É aquela escolha entre chorar ou vender lenço. Implementa- mos na instituição um ritmo com mais agilidade e atitude, e isso fez com que a Santa Casa caminhasse de forma mais dinâmica. Esse sentimento de pertencimento com o time fez com que os colaboradores de modo geral buscassem alternativas de forma estratégica para tirar a instituição de um patamar na posição de vítima, em um processo de dificuldades.

“Nós convidamos padrinhos para apresentar o projeto, que tinha um custo para humanizar os quartos do SUS. Nenhum padrinho convidado titubeou ou negou o apadrinhamento. Tivemos padrinhos que se encantaram tanto que pediram dois quartos, três, quatro quartos. Isso nos encantou e  foi um combustível para gente”

TEMPO – Como isso funciona na prática?

MAURÍCIO SÉRGIO – O que fizemos foi buscar alternativas para  reverter esse quadro. Foi feito um trabalho interno, de modo que todos passaram a se envolver de forma mais direta e objetiva. O trabalho foi crescendo e as parcerias foram acontecendo. Percebi que nós precisávamos mostrar para a população o que se fazia na Santa Casa e como se fazia. Conseguimos trazer um processo de humanização para dentro do contexto,  associado ao trabalho e, principalmente, aos números.

TEMPO – O que a população não sabia sobre a Santa Casa?

MAURÍCIO SÉRGIO – Por exemplo, a população não tinha conhecimento de que o hospital é a segunda maior maternidade do estado de Minas Gerais, fazendo quase 5 mil partos por ano. Somos uma instituição que realiza transplantes de fígado, rim, córnea e músculo esquelético.

TEMPO – Quantos  atendimentos e procedimentos são feitos pelo Sistema Único de Saúde?

MAURÍCIO SÉRGIO – Somos uma instituição que atende quase 80% pelo SUS, e tem o melhor resultado em número e qualidade do estado, tendo a sua curva de pacientes pós-transplantados acima da média Brasil, acima da média americana e quase acima da média europeia, que é o melhor cenário.

TEMPO – Ainda sobre as dificulda- des financeiras, você conseguiu captar grandes empresas como parceiras do hospital. Como a ideia surgiu?

MAURÍCIO SÉRGIO – Temos dois momentos: o primeiro foi dar conhe- cimento para que cidadãos e empre- sas passassem a ter consciência da relevância da instituição na nossa região. E, depois, intensificamos essa divulgação, de modo a gerar uma maior credibilidade da instituição jun- to à população. Fomos muito felizes em buscar parceiros e em trazer a sociedade para abraçar esse projeto de uma nova Santa Casa. Tivemos muita ousadia e coragem. Obviamente que no início tivemos aquelas pessoas que ficaram duvidando e pensando se vai daria certo, e nós conseguimos. O Projeto Amigos da Santa Casa é uma realidade de sucesso.

TEMPO – Como funciona o Projeto Amigos da Santa Casa?

MAURÍCIO SÉRGIO – Nós convidamos padrinhos para apresentar o projeto, que tinha um custo para humanizar os quartos do SUS. Nenhum padrinho convidado titubeou ou negou o apadrinhamento. Tive- mos padrinhos que se encantaram tanto que pediram dois quartos, três, quatro quartos. Isso nos encantou e foi um combustível pra gente. A cada inauguração tínhamos mais pessoas querendo participar. Nós vimos que era possível e fizemos outros projetos, como o Pátio Paulo Denucci, da nossa área de convívio de funcionários, além de várias reformas e humanizações com recursos de parceiros. Estamos colocando as empresas para refletirem um pouco sobre a responsabilidade social que têm.

TEMPO – Por 15 anos, você trabalhou como gestor na iniciativa privada, em empresas de telecomunicações. A gestão de um hospital é diferente? Está acompanhada de quais desafios?

MAURÍCIO SÉRGIO – As empresas das quais fui gestor eram multinacionais que visavam o lucro, resultados. Quando recebi o convite para vir para Santa Casa, eu não imaginava que teria aqui uma oportunidade tamanha de poder ajudar pessoas que nem conheço. O SUS é um programa maravilhoso, espetacular. No entanto, tem suas dificuldades financeiras porque não foi se atualizando e criou um déficit muito grande em suas tabelas. Mas, sem dúvida, proporciona os cuidados e o tratamento para milhões de brasileiros. 60% desses atendimentos são realizados pelas Santas Casas e pelos hospitais filantrópicos. As pessoas às vezes confundem um hospital filantrópico com um público, e não é assim.

TEMPO – Qual a diferença entre um hospital público e um filantrópico?

MAURÍCIO SÉRGIO – As contas do hospital filantrópico chegam da mesma forma, independente do que aconteça. Minha filantropia não quer dizer que não pague impostos, que não tenha que pagar água, luz, fornecedores e profissionais. Às vezes há essa interpretação errada. Para eu atender um paciente do SUS, tenho que fazer um trabalho hercú leo do outro lado para garantir isso. Mesmo assim as pessoas ainda não  têm conhecimento de que há muitos procedimentos e exames que nem sequer constam na tabela do SUS, e a Santa Casa inúmeras vezes arca com isso, paga o material, o medicamento, e o paciente nem fica sabendo, mas é o nosso papel, a nossa vocação, e assim vamos crescendo e evoluindo.

“Somos uma instituição que atende quase 80% pelo SUS e tem o melhor resultado em número e qualidade do estado, tendo a sua curva de pacientes pós-transplantados acima da média Brasil, acima da média americana e quase acima da média europeia, que é o melhor cenário”

TEMPO – Qual a diferença de atendimento pelo SUS ou pelo particular e convênios?

MAURÍCIO SÉRGIO – Falo sempre para o nosso time que a alimentação que vai para os pacientes é a mesma, independente de serem SUS, convênio ou particular. O bloco cirúrgico é o mesmo, o medicamento é o mesmo. O que difere é a acomodação; um vai ficar num apartamento privado, por- que tem plano de saúde ou está sendo atendido como paciente particular, e o outro vai ficar em um quarto com mais pacientes, mas em um quarto humanizado, que tem banheiro, ar-condicionado; temos 90% dessas acomodações já humanizadas.

TEMPO – Ainda há muito o que se fazer?

MAURÍCIO SÉRGIO – Temos muitas dificuldades, muito a melhorar. Porém, olhando pelo retrovisor do tempo, conseguimos ver um avanço, fruto de um trabalho construído a várias mãos, principalmente por parte dos nossos colaboradores, diretores e gestores, que buscam incessantemente a qualidade. As pessoas me perguntam qual a minha formação e falam que não tem nada a ver com a função que exerço. Mas eu fiz pós-graduação em direito empresarial, direito econômico, fiz MBA em gestão hospitalar, e isso contribuiu muito, mas a bagagem que você adquire trabalhando em empresas do porte das que eu trabalhei, contribui muito para se adquirir uma visão mais empresarial.

TEMPO – Ainda notamos que os serviços de saúde estão muito restritos às cidades maiores ou grandes centros… Que avaliação faz sobre isso?

MAURÍCIO SÉRGIO – A descentralização da saúde é importantíssima. Citando o serviço de oncologia, o paciente que sai de Taiobeiras anda 300 quilômetros para chegar a Montes Claros, faz a quimioterapia e volta para a sua cidade. Esse paciente deve ser atendido, dentro do possível, na origem, onde vai ter um acompanha- mento da família, sem deslocamento e sem desgaste. Infelizmente, estamos com as cidades que possuem a média complexidade muito fragilizadas. Pensando nisso, fizemos parceria com Taiobeiras e estamos implementando o serviço de oncologia lá. A partir de janeiro, a quimioterapia dos pacientes da região será feita lá. A Santa Casa vai fazer a gestão, vai levar os médicos, vai fazer a compra de materiais e realizar o tratamento lá.

TEMPO – Existe a previsão de que outras cidades sejam beneficiadas por essa importante iniciativa da Santa Casa?

MAURÍCIO SÉRGIO – Sim. Da mesma forma, fizemos em Porteirinha. Os dois municípios estão com as unidades em construção, e a inauguração será em novembro ou dezembro. Há 15 dias, fizemos o mesmo com Januária. Às vezes, o paciente chega aqui e não tem dinheiro sequer para comprar um pão, fica aqui o dia inteiro, faz uma sessão às 8h e fica esperando até às 16h para retornar para a sua cidade e chegar meia-noite, uma hora da manhã. É desumano. Ainda na descentralização, inauguramos também o Centro de Saúde do bairro Major Prates, que é uma região muito relevante, porque é quase que outra cidade. Temos um projeto de levar a Santa Casa para os principais pólos. Ao invés de o paciente ser obrigado  a se deslocar para ser atendido, ele passa a ter a clínica mais próximo de casa e pode consultar com valores mais acessíveis e profissionais de ponta. Temos esta proposta de tra- balho e vamos considerar a cidade como um todo.

TEMPO – Como se sente, sendo natural de Montes Claros e vendo os bons resultados do trabalho que está sendo feito no hospital?

MAURÍCIO SÉRGIO – Minha esposa brinca comigo, dizendo que não tem um final de semana, uma festa ou um evento que seu telefone não toca. Tudo tem um preço. Sentir que você ajudou, contribuiu, acolheu, que cumpriu seu dever, é muito gratifican te. Sinto-me muito feliz. Te confesso que não é fácil, porque saúde não espera. Dois minutos de dor é como se fossem dois dias. Quando você sente dor, você quer imediatamente ser atendido, tomar um medicamento, ver o problema resolvido e, às vezes, a solução não acontece imediatamente. Sinto-me muito honrado por fazer parte de um grupo de pessoas que de fato atuam numa instituição séria e, sinceramente, não consigo ver a nossa região sem a Santa Casa, que se tornou um porto seguro pra todos nós. Temos pacientes que preferem ser atendidos no corredor do que sair daqui.

TEMPO – Essa grande demanda por saúde foi um dos motivos para o pro- jeto de verticalização do hospital?

MAURÍCIO SÉRGIO – Temos 410 leitos; se colocarmos 500, 600, vai encher. Esse é um dos motivos que estamos com um novo projeto das duas torres. Vamos verticalizar esse atendimento com o espaço que te- mos disponível, e isso vai ser uma mudança muito grande na saúde no Norte de Minas. Estamos pensando em uma Santa Casa para 2050. O projeto das torres é fantástico, e vem sendo pensado há quase 4 anos. Há dois meses nós acertamos com uma empresa de BH e trouxemos isso para a assembleia da irmandade, que aprovou por unanimidade a sequência do trabalho. Apresentamos para o prefeito, que deu todo o apoio, Convidamos os vereadores para uma reunião e eles também aprovaram.

TEMPO – O que o hospital verticalizado vai oferecer?

MAURÍCIO SÉRGIO – Essas duas torres vão proporcionar a todo o Norte de Minas uma segurança muito maior com relação aos atendimento porque vai desafogar a Santa Casa. Quando faço a construção de mais 120 leitos, de 10 salas cirúrgicas, de 10 leitos de CTI, que é a proposta, além de toda a área de apoio de imagem e laboratório, isso vai colocar a Santa Casa de fato entre os melhores hospitais do país. Hoje, nós estamos entre os 10 maiores hospitais filantrópicos e entre as 10 maiores Santas Casas do país. Esse novo complexo vai nos dar um destaque ainda maior e vai fazer uma diferença muito grande. Um outro projeto muito bonito com o qual estamos lidando é o Hospital Infantil do Câncer, que vai ser o mais moderno do país.

TEMPO – Em que pé está o Hospital Infantil do Câncer?

MAURÍCIO SÉRGIO – Fizemos uma parceria com a Fundação Sara e já montamos o projeto, que demos entrada na Prefeitura. Estamos esperando a aprovação para iniciarmos as obras de um prédio de 5 andares, muito bem estruturado, e que vai atender todo paciente infantil com câncer, que estavam restritos aos grandes centros. A gente tem que acreditar. Eu até tenho uma frase na minha sala, que é justamente essa: “Com fé em Deus, enxergamos o invisível para realizar o impossível”. A gente precisa ter isso em mente, pensar no amanhã.

TEMPO – Você foi reconhecido na categoria Gestor de Saúde no Prêmio 100 Mais Influentes da Saúde em 2019 e ganhou duas vezes o “Excelência da Saúde”, que classificou a Santa Casa como um dos melhores hospitais filantrópicos do Brasil. Como se sente?

MAURÍCIO  SÉRGIO  –  Esses prêmios são o resultado de um trabalho muito grande e construído de forma muito sólida, passo a passo, dia a dia, com todas as dificuldades e muita gente envolvida. Eu assumi algumas responsabilidades, trouxe umas ideias, tudo sempre discutido e executado com o nosso time de profissionais. Fiquei muito feliz quando a Santa Casa foi eleita como um dos melhores hospitais filantrópicos do país, na questão do acolhimento, gestão e filantropia. Posteriormente, fui premiado como um dos melhores gestores. Estamos participando de novo e penso que esses reconheci- mentos trazem ainda mais responsabilidade e encorajam-nos a continuar nessa caminhada.

TEMPO – Em algum momento sentiu medo?

MAURÍCIO SÉRGIO – Eu não era da área da saúde, sou um dos gestores mais novos do país. É engraçado porque vim para a Santa Casa com 38 anos, cheguei e fui a um evento com o doutor Heli Penido, então nosso provedor, e quando cheguei no evento, em Salvador, onde estavam os gestores de todo o país, entrei num salão e vi várias cabecinhas brancas, que me olhavam pensando mais ou menos assim: ‘Como alguém tão jovem iria assumir um hospital com quase 400 leitos?’. Doutor Heli, muito sábio, inteligente e maduro, disse uma frase que me marcou: “Você vai devagar pra não balançar muito a estrutura”. Estou com meus cabelos mais grisalhos,  olho para trás e vejo o quanto amadureci, o quanto cresci junto com o hospital. Você passa a olhar diferente para as situações, momentos e pessoas…

TEMPO – Muito se especulou sobre sua candidatura política nestas eleições… Chegou a receber alguma proposta?

MAURÍCIO SÉRGIO – Todos os convites que recebi, nunca pensei em não aceitar. De fato, eu ponderei muito, refleti muito, porque nós temos, nos próximos quatro anos da instituição, talvez o maior crescimento da história da Santa Casa. Estamos falando em quase dobrar o trabalho da instituição; estamos falando de um futuro de 30 anos, e de um compromisso que fiz com o arcebispo, com o provedor e com os nossos colaboradores. Mesmo não aceitando ou adiando um convite para a vida pública, eu preciso participar, preciso exercer minha cidadania para fazer as crí- ticas construtivas. Sempre busquei de forma transparente contribuir com as minhas sugestões. Fiquei de fato muito pensativo com os convites para entrar para a vida pública, discutindo com o provedor, arcebispo, minha família, meus diretores, e a gente viu que não era o momento.

TEMPO – O que sentiu diante dos convites?

MAURÍCIO SÉRGIO – Fiquei muito feliz. Os convites para entrar na política são o resultado do trabalho que a gente tem feito. Se você não faz um bom trabalho e nem contribui de alguma forma, você não vai ser lembrado, vai ser apenas mais uma pessoa. Eu gosto de desafios, de contribuir, de ver algo que participo crescendo. Só que, por enquanto, na Santa Casa ainda vou poder contribuir de forma significativa, proporcionando mais saúde para a população do Norte de Minas.

Compartilhe:

Notícias Relacionadas

Bloco 1 Entretenimento Geral Montes Claros

30ª Festa nacional do Pequi

Bloco 1 Geral Montes Claros

ESTIAGEM PROLONGADA – Montes Claros decreta situação de emergência